27/01/2009

Ao redor do coracao

Às vezes penso que alguém possa ficar incomodado com as descrições que faço aqui de minhas dificuldades físicas. Fico falando de genes, hormônios, escolioses, paralisias e tantas coisas desagradáveis que parece até um blog deprimente. Mas não é.

Quando você entende que nosso corpo é um envoltório, uma embalagem apenas, aí fica mais fácil lidar com essas coisas. Um dia minha embalagem vai ser descartada e eu vou morar com Deus até Ele me dar uma embalagem nova, não descartável e que não precisará nunca ser reciclada. Enquanto isso, vou vivendo aqui com esses defeitinhos da embalagem que não são nada comparados ao produto que vai dentro dela: um coração.

Veja que bonito este poema que meu pai leu em um livro. O engraçado é que a autora do livro é Lucinda Nogueira Persona, esposa de um primo que meu pai só deve ter conhecido quando era muito pequeno e nem se lembra mais. A Internet faz essas coisas e vai reunindo virtualmente famílias que por anos ficaram afastadas praticamente. Aqui vai este belíssimo poema da Lucinda Nogueira Persona que fala do corpo humano, mas sob uma perspectiva bem diferente:

Ao redor do coração


Sete horas da manhã.
Meio raquítico
enferrujado
o sol veio ao mundo.
A vida mal alcançou nossas juntas.


Estamos à mesa
sentados frente a frente
cara a cara
tanto faz.
Um pouco dobrados
à canga cósmica
máscara triste
sim
mas estamos aqui
entre nossas conchas cartilaginosas
atrás de nossos narizes
debaixo de nossos cabelos
ao redor do coração.


Nossa pele – como está séria!
Porém, dentro de nós,
rica em cálcio
e banhada em gordurosa luz,
a caveira sorri.

[Lucinda Nogueira Persona, do livro "Ser cotidiano", editora 7 Letras]

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