A primeira coisa que meus novos pais precisaram me ensinar foi disciplina. Aos quatro anos de idade, eu era um bichinho do mato e trazia uma porção de vícios por causa do abandono. Por exemplo, não gostava que tocassem em mim. Se alguém punha a mão em mim eu dava uns guinchos como gato bravo e vomitava. Era minha defesa.
Também pudera, né? Como iria ser diferente para alguém que nunca teve carinho e viveu largado numa cama imunda com a perna amarrada com uma cordinha para não cair? A médica que me examinou disse que até a formação de meu crânio -- chato atrás -- era de alguém que nunca saiu da posição de costas por todos aqueles anos. E a curvatura de minha espinha fazia de mim uma verdadeira gangorra, se deitado numa superfície plana. A cama onde me deixaram nos primeiros quatro anos de minha vida devia estar afundada no meio. Até hoje sou meio corcunda.
Tem mais: eu não usava as mãos para segurar, só para ficar com elas encolhidas sob o queixo, batendo uma delas no queixo o tempo todo como se estivesse em transe e fizesse aquilo por espasmo. Quer mais? Eu também não ficava sentado. Pelo jeito nunca tinham me colocado nesta posição, pois era só alguém me colocar sentado e eu gritava, guinchava, me esticava todo para voltar à posição horizontal e -- para desespero de meus novos pais -- vomitava.
Depois de tentarem de tudo, eles resolveram ir pelo caminho natural. Decidiram que me criariam exatamente da mesma maneira que criaram meus irmãozinhos. Quando fizesse birra -- e sei fazer birra! -- levaria umas palmadinhas como qualquer criança amada. Eu sei que para alguns pais isso pode parecer estranho, mas meus pais criaram a mim e a meus irmãozinhos assim e funcionou direitinho. Eles seguiram o que diz a Bíblia em Provérbios 29:15: "A vara e a repreensão dão sabedoria, mas a criança entregue a si mesma, envergonha a sua mãe."
É claro que ninguém iria me espancar com uma vara ou machucar. Longe deles tal idéia. Mas iriam seguir um velho ditado que diz que o caminho mais curto para o cérebro de uma criança passa pelo bumbum. Esse tipo de educação com disciplina eles aprenderam com um livro de um psicólogo chamado James Dobson, "Ouse Disciplinar". Funcionou para meus irmãos e funcionaria para mim.
Meus pais decidiram que não teriam pena de mim, ninguém em casa me chamaria de coitado ou me consideraria diferente. É claro que respeitariam minhas limitações, mas eu seria criado como meus dois irmãos. Ninguém iria fazer drama a meu respeito, ou me esconder da sociedade como fazem muitas famílias que têm filhos especiais. Famílias que têm medo de incomodar os outros ou até vergonha de mostrar o filho que têm. Se existe isso? Muito! Mas vou contar da próxima vez.
17/01/2009
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Postagens populares
-
Hoje o que vai ler não fui eu quem escreveu (nem meu pai, o que dá no mesmo). É o texto de uma mãe para seu filho, adotivo como eu. Discutir...
-
Vou contar uma outra história de Natal, mas prepare-se porque é uma história diferente. Não é cheia de estrelinhas cantantes e pastorzinhos ...
-
Minha irmã postou uma foto de meus sobrinhos no Facebook e meu pai viu e logo pensou numa música "He ain't heavy, he is my brother...
-
Outro dia meu pai assistiu "A Casa Caiu", com Steve Martin. O ator faz o papel de um advogado que conhece uma mulher na Internet ...
-
Meu pai já fez muitas coisas na vida, mas hoje ele acordou teimando que nunca tinha feito um bolo. Bem, se você levar em conta a péssima mem...
-
Meu pai recebeu, via Facebook, um texto escrito por um pai de adoção que expressa bem o que sentem essas pessoas que adotam crianças cheias...
-
Enquanto isso acontecia, a mais de mil quilômetros dali meus futuros pais estavam com um problema. Os joelhos já estavam formando calos, de ...
-
Meu pai aproveitou o Dia dos Pais para fazer uma faxina na estante do escritório. Mas como ele é muito curioso, a cada minuto parava para ve...
-
Até parece brincadeira perguntar isso, não é mesmo? Mas estou falando sério. Você não é um que quer ter respostas para tudo? Eu também, en...
-
Não é dia dos pães de padeiro não. É dia dos pães, e vou explicar que pães são esses. Tem Dia dos Namorados, Dia dos Pais, Dia das Mães, Dia...
Nenhum comentário:
Postar um comentário